segunda-feira, 2 de agosto de 2010

MOMENTOS DE REFLEXÃO… (5) * Faleceu Mário Bettencourt Resendes

MOMENTOS DE REFLEXÃO… (5)
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Faleceu Mário Bettencourt Resendes
Jornalista e Mestre!




Paulo M. A. Martins_________________________
paulo.m.a.martins@gmail.com



- Bom Dia, Ilustre Director, bons olhos o vejam!
- Olá, Paulo Martins! Como vão os assuntos do Mar?


Num final de tarde, como vinha sendo meu hábito, encontrava-me na Redacção do Diário de Notícias quando o telefone tocou. Prontamente, atendi. Do outro lado, surgiu uma voz, para mim então desconhecida, perguntando se eu estava, tendo-lhe respondido:.

- Sou o próprio.

- Aqui, é Mário Resendes. Importar-se-ia de vir agora ao meu gabinete, pois gostaria de falar consigo.

- Com certeza, vou imediatamente para aí.

À porta do seu gabinete, a escassos metros da Redacção, o então redactor principal do Diário de Notícias, Mário Bettencourt Resendes, aguardava por mim. Instantes depois, ao chegar, cumprimentámo-nos e, de imediato, convidou-me a entrar e pediu-me para me sentar na cadeira em frente à sua secretária. Ficámos frente-a-frente, olhos nos olhos.

Para grande surpresa minha, ao iniciar a conversa, começou por me dizer que o que pretendia transmitir-me era absolutamente confidencial. Portanto, a conversa ficaria entre nós, ao que eu acedi e concordei sem qualquer reserva.

Começou, então, por me dizer que havia já algum tempo que estava a acompanhar todo o meu trabalho no “Suplemento de Economia”, que se publica à segunda-feira, e que apreciava imenso a forma como eu abordava e tratava as matérias sobre o Sector do Mar (Navegação e Transportes Marítimos, Actividade Portuária e, sobretudo, o Sector das Pescas), pelo que lhe agradeci pelas referências evidenciadas.

Depois, entrando no campo das confidências, revelou-me que, dentro de dias, iria assumir a Direcção do Diário de Notícias, substituindo o então director, jornalista Diniz de Abreu. Fiquei perplexo. Prosseguindo, convidou-me a integrar a sua equipa, propondo-se manter-me no “Suplemento de Economia” e com as mesmas áreas. E, como remate final, disse-me:

- Não se trata de um pedido ou convite informal, mas, sim, de um imperativo profissional!

Tendo-lhe respondido:

- Face à forma como me coloca esta questão, o mínimo que lhe posso dizer e, desde já, garantir é que pode contar com toda a minha dedicação, lealdade, transparência e honestidade pessoal e profissional.

Ele agradeceu-me imenso por poder contar comigo e, entretanto, ainda ficámos mais alguns momentos a conversar.

Em boa verdade, eu mal conhecia o Mário Bettencourt Resendes, apesar de, por várias vezes, nos termos cruzado no corredor de acesso ao gabinete do director, no corredor de acesso à Direcção.

Dois dias depois, o director, jornalista Diniz de Abreu, chamou-me ao seu gabinete para me agradecer por toda a colaboração prestada e dar conhecimento de que, na edição seguinte, o Mário Bettencourt Resendes assumiria a Direcção do Diário de Notícias, pelo que estava confiante de que viesse a ser convidado para integrar a sua equipa.

Não só não reagi perante a informação, como respeitei a escrupulosamente a confidencialidade da conversa havida dois dias antes, que, agora, pela primeira vez, estou a revelar publicamente.

Ao longo do tempo, mantivemos uma excelente interacção pessoal e profissional, tendo o seu ponto mais alto ficado fortemente marcado pela questão da “matança indiscriminada de golfinhos nos Açores”, uma reportagem da revista alemã “Quick”, que o Canal 1, da RTP, transmitiu, com toda a pompa e circunstância, no Telejornal das 20m horas, do Dia de Portugal, 10 de Junho de 1992.

No dia seguinte, como habitualmente, passei pelo Ministério do Mar, em Lisboa, onde era aguardado pela Directora Regional de Pescas da Região Autónoma dos Açores, que pretendia falar comigo, tendo por objectivo a reposição da verdade sobre o trabalho apresentado, na véspera, pelo Canal 1, da RTP.

Obviamente, sem qualquer compromisso, a pedido de um director da Direcção-Geral de Pescas, ouvia-a atentamente, colhendo algumas notas sobre as suas declarações, disse-lhe que, antes de mais, teria que conversar sobre o assunto com o meu director, curiosamente, também, açoriano, e só depois voltaríamos, se fosse o caso, a marcar novo encontro para conversarmos.

De imediato, dirigi-me para o Diário de Notícias, onde, por outros motivos, o Mário Resendes me aguardava. Falei-lhe sobre a questão dos golfinhos e sobre a conversa havida com a Directora-Geral de Pescas dos Açores. Depois de me ouvir atentamente, o Mário Resendes perguntou-me se estaria disponível para me deslocar aos Açores, à Cidade da Horta, no Faial, a fim de, dada a gravidade do assunto, fazer uma reportagem mais circunstanciada, inclusive com a possibilidade, caso achasse necessário, de me deslocar a outras Ilhas do Arquipélago dos Açores, como se veio a verificar.

Dias depois, parti para a Cidade da Horta, na Ilha do Faial, onde durante cerca de uma semana fiz reportagem, tendo-me, também, deslocado à Ilha do Pico e à Ilha Terceira. Tudo foi passado a pente fino. Conversas com armadores, pescadores, pessoal das Lotas, cientistas, técnicos, autoridades civis e militares, políticos, etc., etc. Foi, de facto, um trabalho extenuante mas agradável.

Quando no regresso, com dez páginas de formato A4 impressas, desloquei-me ao Ministério do Mar para falar com o Ministro sobre o assunto. Depois, desloquei-me, imediatamente, para o Diário de Notícias, onde o Mário Resendes já me aguardava, evidenciando alguma impaciência pela minha demora.

Já no seu gabinete, depois de uma conversa sobre a viagem, sem quaisquer comentários, fiz-lhe a entrega do texto impresso e de algumas fotos, tendo, de imediato, chamado o responsável pelo Departamento de Fotografia do “DN” para avaliar a sua qualidade, tanto mais, porque algumas eram as fotocópias de fotos entregues, em mão, por um representante da revista “Quick” ao Ministro do Ambiente.

Depois de uma leitura atenta do texto corrido, ainda sem título, subtítulos, legendas para as fotos, pediu-me a ‘diskete’ e iniciámos a paginação (diagramação) do trabalho. Depois de duas horas, o trabalho estava pronto a dar à estampa, a ser publicado. Deu-me os parabéns pelo trabalho realizado e despedimo-nos.

Missão cumprida!

Estava reposta toda a verdade dos factos, desmascaradas e desmontadas todas as campanhas de mentiras caluniosas e criminosas que pretendiam arrasar com a pesca do atum em águas açoreanas, onde a presença e a influência do ‘Green Peace’ não era pacífica!

Dias depois, voltámo-nos a encontrar e ele disse-me que ia deslocar-se aos Açores, onde entre outros assuntos, iria apresentar o trabalho que seria publicado no domingo, 6 de Setembro. E, ‘en passant’, dizia-me:

- Agora, já é tarde, se não fosse por coisas, levava-o comigo!

Na semana seguinte, depois de regressar dos Açores, mandou-me chamar para me dizer que já estava muito arrependido de não me ter levado com ele, pois a apresentação do trabalho tinha sido um sucesso nunca visto nem imaginado, assim como a edição do Diário de Notícias havia esgotado literalmente em toda a Região Autónoma dos Açores.

Todavia, as repercussões também se fizeram sentir no Continente e no estrangeiro. Perante o silêncio absoluto e rigoroso da RTP, toda a Imprensa, Rádio e restantes canais de TV fizeram eco. Também, em minha casa, o telefone não deixou de tocar durante todo o dia…

Obviamente, todo o relacionamento com o Mário Bettencourt Resendes não se esgota neste pequeno episódio. Foi muito mais do que isso: o director, o amigo, o companheiro, o camarada e, porque não, também o irmão?

A Comunicação Social portuguesa acaba de perder um dos seus mais brilhantes, competentes, sérios, honestos, transparentes e frontais profissionais: Um Jornalista e, dada a sua actividade docente, também um Mestre!


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HOMENAGEM A MÁRIO BETTENCOURT RESENDES
Jornalista e Mestre!
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GOLFINHOS DOS AÇORES
foram arma comercial



Por:
Paulo M. A. MartinsNos Açores


Uma reportagem publicada recentemente numa revista alemã, que acusava os pescadores açorianos de massacre de golfinhos, poderá estar relacionada com as dificuldades na conquista de mercados por parte de indústrias conserveiras de outros países.

O DN - Diário de Notícias investigou e descobriu que a Quick, por sinal uma publicação com a morte já anunciada, utilizou indevidamente fotografias, procedeu a montagens e pode ter sido “inspirada” por organizações ecologistas com ligações a conserveiras.

A reportagem foi publicada na Alemanha por uma revista conhecida pela sua propensão para o sensacionalismo, a “Quick”. Estava-se em Junho quando a televisão divulgou a notícia e mostrou as imagens que deixaram o País surpreso e incrédulo.

Afinal, tudo não passou de uma história e, até ver, propositadamente mal contada...


MATANÇA DE GOLFINHOS NOS AÇORES
FOI UMA MONTAGEM


“O ofício sangrento dos caçadores portugueses de atum – golfinhos ingénuos esquartejados para isco” foi o título de uma reportagem assinada por Gerhard Walter, publicado pela revista Quick, edição de 11 de Junho, enquanto a Eco-92 decorria no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro.

É um trabalho desenvolvido ao longo de quatro páginas, ilustrado com fotografias, e cujo texto denuncia a captura de golfinhos com a utilização de arpões e caçadeiras. Os animais, depois de esquartejados em pequenos pedaços, serviriam de isco para, de imediato, serem utilizados na pesca do atum.

O crime teria lugar nos Açores, mais concretamente na Ilha do Pico, e envolveria uma pequena frota de dez embarcações. A verdade será, afinal, muito diferente da versão do repórter alemão.

A notícia da matança indiscriminada de golfinhos, nas águas da Região Autónoma dos Açores, foi divulgada em primeira mão pelo Canal 1 da RTP, ao fim da noite de 10 de Junho. No ar, ficara a estupefacção, a emoção e, até mesmo, a revolta perante a crueza e violência dos factos denunciados pela revista alemã Quick, “ensanguentando”, com todo o sensacionalismo o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades, com Portugal a exercer a presidência da CE e, simultaneamente, a participar, no Rio de Janeiro, na Eco-92.


Cenário montado


No dia seguinte, a revista Quick chegava às bancas e no Ministério do Ambiente, em Lisboa, um seu representante, de férias em Portugal, procedia à entrega de material fotográfico adicional (fotocópias de fotografias coloridas) classificado de secreto, e denunciador da carnificina de golfinhos.

O cenário estava montado e as suas repercussões fizeram-se sentir, de imediato, no seio da Eco-92, colocando Portugal, particularmente os pescadores açorianos, no banco dos réus da opinião pública.

No acto da entrega das “provas” ao Ministério do Ambiente, foi declarado, aos órgãos de comunicação social, que as 18 fotografias haviam sido batidas oito dias antes da publicação do “exclusivo”, assinado por Gerhard Walter, durante uma pescaria nos Açores, ocorrida em Junho, como de resto, é referido na reportagem.

Analisadas as “provas”, a que o DN teve acesso, concluiu-se que as fotografias, utilizadas pela Quick faziam, afinal, parte de uma reportagem fotográfica, realizada pelo fotógrafo italiano Paolo Piola, em 1987, algumas das quais foram, nesse ano, vendidas a uma empresa de publicidade de Génova. Anualmente, desde 1987, a Associação dos Industriais de Conservas de Peixe dos Açores, que integra a B. J. Borges, SA., Cofaco – Comercial e Fabril de Conservas, SA. e a Corretora – Soc. Corretora, Lda., desenvolve campanhas promocionais sobre as conservas de atum em Itália, principal destinatária das exportações açorianas, que ascendem a cerca de dez mil toneladas/ano.


As “provas” à lupa

Segundo documentação em poder do DN, foram publicadas algumas fotografias propriedade da referida Associação, detentora dos respectivos copyrights, que haviam sido utilizadas nas referidas companhas promocionais, sob a responsabilidade da empresa de publicidade Classis – Génova. Sobre as “provas” entregues no Ministério do Ambiente, posteriormente analisadas, conclui-se:

• Da colecção de 18 fotografias, destaca-se uma que apresenta o porto de Génova, em Itália, que se pretendia fazer passar por um dos portos açorianos... não fosse a presença, em excelente plano, de uma lancha da Polícia italiana;

• A fotografia publicada na página 12, com a legenda “O que fica dos confiantes mamíferos do mar são pedaços de carne / ensanguentadas iscas para a pesca do atum / por dia e por barco morrem três golfinhos”, refere-se à demonstração de uma das fases de preparação do atum para conserva, onde se procede à retirada do sangacho, obtida nas instalações fabris da Cofaco, na ilha do Pico. Trata-se, segundo as provas em poder do DN, de uma fotografia largamente difundida em Itália, figurando em calendários, dépliants, livros de receitas culinárias regionais sobre o atum e não como falsamente se pretende, a preparação de uma isca;

• Também várias outras, demonstrativas da pesca do atum, foram publicadas em anos anteriores a 1992;

• As duas fotos publicadas com a legenda “Em barcos de pesca portugueses são esquartejados os mamíferos do mar, amigos do homem” pertencem à mesma colecção de 1987.

Perante os factos apurados, o DN avançou para o terreno, onde desenvolveu, durante vários dias, particularmente nas Ilhas do Pico, Faial e Terceira, inúmeras pesquisas, contactos e investigações tendentes ao apuramento da verdade possível.


Apenas a cana de pesca

Na pesca do atum nos Açores é utilizada, exclusivamente, como arte de pesca, a cana com isco vivo, tendo como aparelhos específicos os anzóis, a vara, o salto e a linha de mão, e que se denomina de “salto e vara”. Esta arte, altamente selectiva, é usada na Comunidade Europeia apenas pela frota atuneira portuguesa açoriana e madeirense, pela frota basca no Norte de Espanha e por uma pequena frota francesa no Mediterrâneo. Os Açorianos nunca utilizaram redes para a captura do atum. Tanto a frota artesanal como a industrial, nos Açores, praticam, como método tradicional, a pesca com isco vivo para a captura de tunídeos, confirmando, claramente, não fazer qualquer sentido a referência à matança de golfinhos e o seu esquartejamento para isco.

Aliás, anualmente, é publicada legislação nacional que permite às embarcações atuneiras dos Açores e Madeira operar junto à costa precisamente para lhes possibilitar a captura do isco vivo para a pesca do atum.


Absurdo

Daí que, a bordo das embarcações, o isco seja mantido vivo durante vários dias dentro de tanques de secção quadrada, sob renovação contínua de água. Normalmente, utiliza-se como isco sardinha pequena, carapau, chicharro e cavala, que, durante o tempo de permanência nos tanques e até à sua utilização, são alimentados com peixe moído e papas de farinha de milho.

Assim, de acordo com a espécie utilizada como isco vivo e o seu tamanho, irá corresponder a espécie e a dimensão do atum a capturar, destacando-se o patudo, bonito, voador, rabilo e albacora.

Refira-se, ainda por cima, que as embarcações de pesca a que se refere a reportagem da Quick fainam no mar, no máximo, dois dias consecutivos, sendo absurda a afirmação produzida, segundo a qual registam uma permanência de 12 dias.

Em 1983, antecipando-se à promulgação da legislação nacional, a Assembleia Legislativa Regional da Região Autónoma dos Açores fez aprovar leis interditando as capturas de mamíferos marinhos, designadamente todas as espécies de golfinhos.

A partir dessa altura, os pescadores açorianos assumiram como “código de honra” o rigoroso cumprimento dessa determinação legal.

Todavia, importa sublinhar, foi o renunciar a hábitos e tradições arreigados e seculares, já que, tal como na Região Autónoma da Madeira, a carne de golfinho fazia parte da alimentação, assim como a captura da baleia, outrora base da economia da Ilha do Pico, é motivo de celebração de festas tradicionais que anualmente se realizam.

Hoje, decorrida quase uma década, é patente a adesão das populações às novas regras de vivência e postura. É de admitir, no entanto, que ainda possam subsistir alguns infractores, pertencentes a gerações mais antigas, ou outros animados pela curiosidade, muitas das vezes estimulada e incentivada por forasteiros que não perdem a oportunidade para “saborear” um naco de carne de golfinho.


Explicação

A fotografia da Quick onde se esquarteja um golfinho é explicada por um dos responsáveis pela unidade fabril da Cofaco, na ilha do Pico, “como o exemplo de um caso pontual onde o pessoal da tripulação, pressionado e incentivado por pessoas estranhas que, com regularidade, embarcam nos navios para presenciar a pesca do atum, se deixa ingenuamente arrastar para a contravenção”.

Tratar-se-ia de “um caso pontual ocorrido em 1987, cujas imagens agora vieram a lume, quando a embarcação visada permanece, juntamente com mais sete, varada há cerca de quatro temporadas, primeiro por falta de tripulação e, de momento, aguardando o final da tramitação administrativa para, com mais quatro, integrar uma sociedade mista luso-cabo-verdiana”.

É muito frequente verificar-se nas embarcações a presença de fotógrafos, operadores de televisão e cinema e jornalistas nacionais e estrangeiros, além de inúmeros turistas que, atraídos pela curiosidade e pelo fascínio provocados pela espectaculosidade da pesca do atum com salto e vara, aproveitam para registar a raridade dos momentos impressionantes e inesquecíveis que esta actividade propicia.

Hoje, é bem visível na Ilha do Pico o florescimento de um produto turístico ligado à pesca, aos mamíferos marinhos e à antiga actividade baleeira. O museu da Vila das Lages do Pico, a reconstrução das antigas fábricas da baleia, a reactivação das vigias e lanchas baleeiras para passeios turísticos e a realização de regatas são disso bons exemplos.


Devoradores de peixe
sob controlo no Japão


São conhecidos os efeitos depredadores do golfinho, dado que a sua presença afugenta os cardumes, obrigando os pescadores a um esforço acrescido de trabalho, dispêndio de tempo e combustível.

Também, como seu sustento diário, devoram os cardumes numa proporção que varia entre cinco a dez por cento do seu peso, concorrendo para a depauperação dos stocks dos recursos piscícolas disponíveis, que, por sua vez, estão ainda sujeitos a esforço de pesca.

Recorde-se, a propósito, que os japoneses, anualmente, no início da Primavera, e com o objectivo de desenvolverem a renovação, o rejuvenescimento e o controlo dos stocks de golfinhos, procedem a um abate selectivo, onde, primeiramente, são eliminados os mais antigos.

Importa sublinhar que ascendem a centenas de milhares os golfinhos que passam e permanecem em águas açorianas.

O aparecimento frequente de cardumes de golfinhos ao longo das costas das ilhas é um fenómeno corrente com o qual os açorianos convivem há séculos e, se transformou, nos últimos anos, num fenómeno de atracção turística.


UMA GRANDE “PESCARIA” DE INTERESSES


A intervenção das organizações ecologistas no que se refere à relação pesca do atum/captura acidental de golfinhos tomou enormes proporções desde 1989, com reflexos negativos no mercado internacional do atum, a que não são alheios fortes interesses comerciais. Vejamos os factos:

- Numa zona bem definida do Pacífico Leste, acontece um fenómeno único, ainda não explicado cientificamente: os cardumes de golfinhos coabitam com os cardumes de atum. Nesta zona, extremamente rica, pescam frotas centro-americanas, nomeadamente a frota mexicana, a segunda maior do mundo. Nos últimos anos, o México incrementou a sua frota e indústria de conservas, exportando grandes quantidades de atum e conservas, nomeadamente para o seu vizinho, os EUA.

Trata-se de frotas de grandes navios que utilizam como arte as redes de cerco e que, devido a este fenómeno de coabitação, capturavam por ano, nas suas redes, até muito recentemente, centenas de milhares de golfinhos cujos cadáveres eram devolvidos ao mar. Este fenómeno já vinha a ser denunciado por organizações ecologistas, nomeadamente a Greenpeace.

• Em 1989, a maior empresa de conservas norte-americana promove uma gigantesca campanha publicitária das suas conservas, que passaram a ser vendidas com o rótulo “Dolphin Safe”, significando que as suas conservas eram feitas com atum que não provinha do Pacífico Leste e, portanto, não eram responsáveis pela morte de golfinhos. Esta campanha foi lançada com o apoio da Greenpeace, que passa a receber uma comparticipação financeira pelos rótulos utilizados.

• Simultaneamente, foi promovida uma grande pressão política para que fosse proibida a importação de atum e conservas dos países que utilizam atum capturado naquela zona. Esta pressão atingiu os seus objectivos e, um ano depois, os EUA declaram o embargo às importações.

• Esta medida teve efeitos directos desastrosos na indústria atuneira centro-americana, nomeadamente a mexicana e efeitos indirectos no mercado internacional do atum que ainda hoje se faz sentir. De facto, a produção sul-americana tentou desesperadamente encontrar outros clientes, invadindo o mercado internacional com atum a preços baixíssimos, prejudicando todos os outros produtores, nomeadamente os comunitários. Entre 1990 e 1992, os preços do atum no mercado internacional atingiram o valor mais baixo dos últimos dez anos.


Observadores nos pesqueiros


• Entretanto, foi mobilizado um vasto e dispendioso programa de colocação de observadores de organizações ecologistas e estatais a bordo dos navios de pesca de atum que operam no Pacífico Leste, financiado pelos governos interessados, que vigiam as operações dos navios e libertam os golfinhos que caem nas redes antes de estas serem aladas.

• Actualmente, a Comissão das Comunidades Económicas estuda a possibilidade de os países comunitários declararem também o embargo, tentando conciliar as regras do Direito Internacional com os interesses comerciais, por vezes contraditórios, dos Estados- membros.

• Uma outra questão começou a dar os primeiros passos a nível mundial, culminando com uma resolução das Nações Unidas: foi proibida a utilização de redes de emalhar para a captura de grandes pelágicos, redes que podiam atingir 50 quilómetros de extensão e que, além de realizarem uma captura indiscriminada, constituíam autênticos cemitérios oceânicos quando perdidas. Trata-se de uma arte muito produtiva e eficaz, cuja proibição atingiu as frotas de todo o mundo.

• Esta medida, extremamente polémica, foi aprovada por todos os Estados membros da CE, com algumas reticências da França, e claramente apoiada por Portugal na Comissão Internacional para a Conservação do Atum do Atlântico.

Esta comissão, integrando 23 países que pescam no Atlântico, é responsável pela gestão internacional dos stocks de atum deste oceano, sendo presidida, desde 1991, por Adolfo Ribeiro Lima, secretário regional da Agricultura e Pescas dos Açores.

• As organizações ecologistas resolveram, entretanto, começar a intervir no oceano Atlântico, onde, como é sabido, não existe a coabitação dos cardumes de golfinhos com os cardumes de atum, mas poderá existir, isso sim, um pequeno índice de capturas acidentais de golfinhos nas redes de cerco. Com o fim de defender os interesses da frota atuneira de cerco (espanhola e francesa) que opera no Atlântico, a CEE já lançou um programa que visa a colocação de observadores a bordo destes navios, para que não subsistam dúvidas quanto às características da pesca no Atlântico.

• O que parece certo é que as conserveiras europeias vão chegar a acordo com as organizações ecologistas e, também elas, mais cedo ou mais tarde, vão passar a utilizar nas suas latas de conservas os rótulos “Dolphin Safe”, agora nas versões das diversas línguas comunitárias...

Nesta polémica das artes de pesca do atum há um ponto em que todos parecem estar de acordo, e que vem bem expresso nos mais diversos relatórios científicos, é que a arte utilizada pela frota portuguesa, o “salto e vara”, é a única que garante a protecção completa dos mamíferos marinhos e a selectividade da pesca das próprias espécies de tunídeos.


Críticas de biólogos
na revista “Quick”


A Quick revelou ter também fotografias secretas que provariam o incumprimento premeditado, pelos pescadores de um país da Comunidade, do direito internacional sobre a protecção dos animais.

É referido ainda que, na lei “sobre a conservação das plantas e animais selvagens europeus”, do chamado tratado de Protecção (subscrito por Portugal), o golfinho foi considerado “espécie sob protecção rigorosa”.

No “exclusivo”, Gerhard Walter apresenta depoimentos de entidades relacionadas com a área ecológica e protecção da natureza. A bióloga marítima e presidente da Sociedade Protectora dos Mamíferos, a alemã Petra Deimer, figura bem conhecida pelas comunidades piscatórias, dadas as suas frequentes permanências nos Açores, relacionadas com questões da actividade baleeira na Ilha do Pico, é uma das entrevistadas. Frontalmente, acusa os pescadores portugueses de “premeditada e perfidamente”, assassinarem os golfinhos com total desrespeito pela lei vigente.

Ao declarar que, “na verdade, a pesca à linha constitui uma boa possibilidade de assegurar a existência do atum no Atlântico, mas que aquela que os pescadores dos Açores pratica escarnece todo e qualquer pensamento de protecção da natureza”, a bióloga e especialista em protecção da natureza junto da World – Wildlife - Fund (WWF) alemã, Gonvar Pohl-Appel, sugere que, “em vez de carne de golfinho, os pescadores podiam também atirar para a água latas de folha, como isca, porque o atum pica tudo o que se mexe na água”.

Pela Greenpeace, o biólogo Thomas Henningsen, comentou que “a verdadeira tragédia deste acto bárbaro se deve ao facto de os criminosos não poderem ser apanhados em flagrante”, e acrescenta: “Quem pode fiscalizar barcos tão pequenos fora do mar? Além disso, todas as provas a bordo são imediatamente inutilizadas e, em terra, torna-se impossível demonstrar o assassínio dos golfinhos.”


CE comenta


Contactada a CE, em Bruxelas, Xavier Prats declarou à Quick: “O assassínio dos golfinhos, para além de ser uma infracção às normas da CE, é contra toda a moral. Pouco podemos intervir. Resta-nos solicitar ao Governo português que ponha termo a esta carnificina”.

Gerhard Walter inclui um depoimento do maior importador de atum da Alemanha, Werner Krugel, da Saupiquet, em Nuremberga, responsável pela venda anual de 200 milhões de latas de atum que declarou: “Quem pesca atum com carne de golfinho é demente. Lutaremos por todos os meios contra este mau precedente. Há anos que lutamos por uma pesca de atum limpa, prescindimos das redes de emalhar para proteger os golfinhos e outras espécies vivas do mar e, entretanto, sucede um caso como este. Esta gente coloca os pescadores honestos com má fama. É como uma família com três filhos, se um se porta mal todos os outros são castigados pelo mesmo motivo”.

O autor faz ainda uma estimativa dos golfinhos mortos por ano nos Açores, considerando que “estão a ser mortos, por dia e por barco, três golfinhos. Numa frota de dez barcos, que, como se provou, foram observados no seu sanguinolento ofício, são 30 animais. Os barcos ficam em média 12 dias no mar - o que representa cerca de 360 golfinhos por viagem.

Os pescadores portugueses vão duas vezes por mês ao mar, 24 vezes por ano. Na pior circunstância, ou seja, por ano, são 8600 golfinhos”.

Paulo M. A. MartinsAçores, Agosto.1992

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Grande Reportagem, “GOLFINHOS DOS AÇORES foram arma comercial”, publicada na edição de domingo, 06.Setembro.1992, do DN - Diário de Notícias, Lisboa - Portugal, com manchete, na 1ª. página e desenvolvimento nas páginas 18 e 19.
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Legendas das fotografias
• O atum, nos Açores, é apenas capturado à cana, pelo método de “salto e vara”
Foto: Direitos reservados PM/DN.

• Na captura do atum é utilizada, exclusivamente, a cana com isco vivo, tendo como aparelhos específicos os anzóis, a vara, o salto e a linha de mão, e que se denomina de “salto e vara”.
Foto: Direitos reservados PM / DN.

• Os métodos de reportagem utilizados pela revista “Quick” permitiram que esta foto do porto de Génova, em Itália, fosse apresentada como sendo dos Açores.
Foto: Direitos reservados PM/DN.

• A Greenpeace – ligada a uma campanha do maior produtor de conservas norte-americano – juntou-se ao coro de protestos
(Foto: EPA - Lusa).

• Qualquer pessoa ligada ao sector sabe que não há confusão possível entre a carne de atum e a de golfinho
(Foto: Direitos reservados PM / DN).


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